Meu lado feio fica confortável com você
No dia em que você chegou, não me preocupei em abotoar a blusa, calçar um sapato, pentear os cabelos ou retocar a maquiagem. Não aspirei o chão, dobrei as roupas começadas que ficavam no braço da poltrona da sala nem guardei a louça. Não fiz questão de esconder a calcinha pendurada no chuveiro, o papel do chocolate que comi ontem nem aquela foto horrível que tirei quando era adolescente.
Meu lado feio tava confortável sendo ele mesmo com você: não precisei parecer santa ou fingir que não queria transar no primeiro encontro. Nem perguntei se você comia carne, ou se gostava de curry: fui lá e fiz o que eu tava com vontade de comer.
Nem te esperei pra abrir o vinho, porque sabia que íamos acabar com todas que haviam na despensa, de qualquer forma.
Quando você chegou, não fiz cerimônia pra te abraçar bem forte, nem tive vontade de impressionar: deixei meu dicionário de palavras difíceis de lado, só pra falar trivialidades com você. Não tinha velas, decotes ou salto alto: tinha eu ali, nua por dentro, só querendo falar de nós.
Não senti vergonha de dizer o que tava pensando, nem medo de tocar seu rosto. Não pensei duas vezes pra te fazer um cafuné ou te olhar bem dentro do olho: tava tudo bem se você já descobrisse que eu tava apaixonada por você.
Tirei sua roupa no meio da sala, sem precisar fazer sala alguma. Não fiz questão de apagar a luz nem de esconder meus quilinhos extras. Eu queria mesmo é que você visse minha silhueta, minha manchinha de nascença e todas as pintinhas que se espalham pela pele que decidi colorir com tatuagens.
Eu te olhei por dentro, sem medo do que sentir aquilo tudo poderia causar se não fosse correspondido. Te beijei de olho aberto e dei um pequeno beliscão, só pra me fazer acreditar que não estava sonhando: que o amor estava ali, e mesmo me vendo do jeitinho que era (por dentro e por fora) não sentiu vontade de fugir de mim.
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